sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A Linguagem em Cametá


A língua oficial do Brasil é a portuguesa, porém desde o primeiro momento da formação do povo brasileiro, foram se unindo ao léxico português palavras novas, oriundas da cultura de outros povos, entre eles, os mais significativos foram os indígenas e os negros, os quais forneceram muitas palavras para o nosso vocabulário.

O linguajar dos cametaenses possui muitas palavras, em sua maioria, oriundas dos indígenas. O próprio nome do município é de origem indígena: Cametá provém de Camutá (caa significa mato, floresta, bosque, erva; mutá significa degrau, armação construída no mato para espera de caça).

Desse modo, entre os falantes cametaenses, como muitos outros falantes amazônidas, encontramos palavras como: banzeiro (palavra de origem indígena que significa movimento das águas do rio provocado por vento, passagem de barcos ou pela pororoca); beiju (palavra de origem indígena, espécie de biscoito arredondado e achatado, de massa de mandioca); carapanã (palavra de origem indígena, espécie de mosquito); casco (palavra de origem indígena, canoa feita de um só tronco de árvore); jambu (palavra de origem indígena, erva utilizada na culinária da região amazônica, principalmente no tacacá); quiriri (palavra de origem indígena que significa calmaria, silêncio, tristeza); etc.

No entanto, a linguagem em Cametá não está apenas vinculada aos traços culturais dos povos já mencionados. Quão ricas são as manifestações lingüísticas dos cametaenses, que mostram sua criatividade através da criação de palavras e de expressões típicas desse povo. Ora, quem aqui em Cametá nunca ouviu alguém dizer: achi (palavra que exprime espanto, admiração ou dúvida), avortado (grande quantia de. , excesso), bandalhêra (brincadeira, festa, farra ou feitiço de macumba), cuíra (curiosidade, ansiedade),teba (grande, enorme), vergar (dobrar, cair), gaiato (pessoa bricalhona), até por lá (uma forma de despedida), -Que tá parente?Tá bom?(uma forma de saudação), etc.

Esse povo também modifica as palavras em seu falar causando variações sobre a estrutura lingüística no nível da fala, a exemplo disso, temos os seguintes fenômenos lingüísticos encontrados no linguajar dos cametaenses: rotacismo (troca do r pelo l: algum > argum; planta > pranta; etc.), redução das flexões verbais (nós fala, nós vai, nós falemu, nós fala, eles falaru, etc.), simplificação verbal (us velhu, casas grande, etc.), alternância vocálica (e > i: menino > mininu; cemitério > cimitériu; o > u: costume > custumi; boto > butu; boca > buca; doida > duida; etc.), ampliação de significado de palavras dicionarizadas (mamada=pessoa bêbada; bobagem=interesse amoroso por alguém; fantasiado=pessoa bem vestida,etc.)

Enfim, o povo cametaense, através de suas manifestações lingüísticas, torna mais fácil o modo expressivo de transmitir suas idéias e toda essa criatividade não é um erro, é uma marca lingüística da população e nós temos que valorizar e respeitar essa diferente forma de linguagem, pois na língua só há diferenças - como afirma o lingüista Saussure – caso contrário, estaremos sujeitos ao, segundo Ataliba Teixeira de Castilho (estudioso da língua) “complexo de incompetência lingüística”, isto é, o indivíduo não fala porque acha que fala errado, afinal de contas:

(...) não há uma língua certa e outra errada. Cada manifestação lingüística é tão bem estruturada quanto qualquer outra. Dizer “nós vai” e “nós vamos” é apenas uma questão de aceitabilidade – as duas formas podem coexistir, em contextos diferentes; ora, não se vai à igreja da mesma forma que se vai à praia. No dizer das falas modernas, em linguagem tudo é uma questão de adequação afim de justamente se respeitar o outro, mas sem perder a sua identidade em função do outro – isso se chama respeito aos valores culturais alheios. (RODRIGUES, Doriedson. Eles falu errado e nós falemu certo: quando o preconceito vai além da cor. Revista Novo Tempo Amazônia, Cametá/PA, Janeiro/Março de 2002.)

Entretanto, o próprio ambiente escolar não valoriza os caracteres da língua falada pelos cametaenses. A escola apenas ensina a variante padrão da língua, negando ao aluno a formação de ima identidade lingüística. O ensino da língua portuguesa deve, também, levar os alunos a conhecerem outras formas de linguagem, sem perderem a identidade lingüística local. Afinal, em se tratando de linguagem, o certo será aquilo que é adequado ao contexto, pois um indivíduo não falará com o presidente da República da mesma maneira como fala com os amigos em um bar,também, escrevemos um bilhete ou uma carta de amor com as mesmas regras usadas para se escrever uma tese de doutorado. Esse é objetivo do ensino da língua, formar falantes dominantes das várias formas de uso da linguagem, escritores conhecedores das regras utilizadas para a elaboração de textos nos diversos níveis da escrita e indivíduos com uma identidade lingüística local conservada, pois a língua reflete a expressão cultural e os aspectos importantes da visão de mundo do povo que a fala.


Palavras e Expressões do Vocabulário Cametaense:
Achi – exprime uma apreensão, um espanto, uma admiração ou uma dúvida.

Até por lá – uma forma de despedida. A despedida típica do cametauara.

Aré – retrata um descontentamento, uma admiração ou uma desconfiança.

Bandalhêra – brincadeira, festa, farra ou feitiço de macumba.

Beju – espécie de biscoito feito de farinha e mandioca com ou sem pedaços

de castanha do Pará.

Bubuia – termo utilizado para dizer de algo que está boiando na maré.

Buca da nute – diz-se do início da noite, à noitinha, ao cair da noite.

Bucada – indica um ato de comer, fazer um lanche, dá uma mordidinha.

Bumbarqueira – uma grande festa, uma folia sem hora para terminar.

Café simples – café preto sem acompanhamento.

Cametauara – genuíno homem cametaense (homem e mulher).

Chimoa – a parte mais aguada do açaí; o resto do vinho do açaí.

Cuíra – usado para exprimir curiosidade.

Culiar – usado para indicar uma parceria, um conchavo, uma união.

Curuatá – utensílio utilizado para ralar a mandioca para fazer a farinha.

Estorde – algo diferente do costumeiro, que não é normal.

Fato novo – novidade, criação nova, nova composição musical ou literária.

Ficar de mutuca – ficar vigiando, ficar alerta, ficar atento.

Fifiti – mapará pequeno, aquele mapará miúdo.

Fornada – uma seqüência de canções seguida de um intervalo. O Samba de Cacete é constituído de várias fornadas.

Fuliar – tocar e cantar folias religiosas.

Fulhanca – grande festa.

Gaiatice – brinacdeira.

Ilharga – significa estar ao lado.

Impinimar – zangado, aborrecido.

Indireitar – concertar, arrumar.

Ispiciá – o mesmo que especial.

Ladino – refere-se a uma pessoa muito inteligente, ativa, perspicaz.

Lançante – indicado para designar maré alta.

Malamá – meio termo, mais ou menos, um pouquinho.

Malineza – maldade, crueldade.

Mariscar – coleta de alimentos realizada pelo povo ribeirinho.

Mizura – uma pessoa que faz movimentos estranhos; engraçado, gaiatice.

Mundiar – pessoa ou um animal que está sendo vigiado para ser atacado ou enfeitiçado.

Novena – ato religioso composto por nove dias de rezas e um dia de festejos conhecido como o “dia da festa”.

Paragi – lugar, lugarejo, localidade.

Parente – termo utilizado para cumprimentar com cordialidade o nativo.

Pavulagem – metido, soberbo.

Peitada – atarefado, ocupado, trabalhando, fazendo algo.

Piririca – lábios com resíduos de mingau, açaí, frutas ou outra coisa.

Potoca – mentira.

Pudê – muita coisa, muita gente.

Ralhar – chamar a atenção de alguém que fez algo errado.

Remanchiar – chegar mansamente sem ser percebido, ir com cuidado.

Reinar – ficar com raiva, ficar zangado.

Rudiá, rudiando, rudiado – andar em volta de alguém ou de alguma coisa.

Rumpança – violência, raiva.

Sordir – surgir, inventar, sugerir, criar.

Sumano, suprimo, suprimote – saudação típica cametaense, tratamento genuinamente cametaense.

Téba, tebudo – grande, enorme, avantajado.

Teité – coitado.

Teitei – cheio, lotado, transbordando.

Teteé – estar à toa.

Varrição – final de uma festa, despedida da festividade, os últimos momentos de folia.

Vergar – dobrar, cair.

9 comentários:

  1. Égua, muito bom. Eu sou cametaense e reconheci varias palavras, q eu mesma falo!

    ResponderExcluir
  2. Gostei,pois tira dúvidas de algumas palavras que o paraense fala e não sabe da origem dela.A minha dúvida foi remanchiar aprendi com minha mãe e minha filha também usa,ficamos curiosa de saber o significado e se estava sendo empregado certo,pensei até que não ia encontrar a palavra,mas encontramos aqui também outras.Achamos ótimo,obrigada.

    ResponderExcluir
  3. Obrigado achei todas as coisas que eu queria ❤️🙏

    ResponderExcluir
  4. Égua mano,de roxa,tá só o creme isso que tu fizeste

    ResponderExcluir
  5. Casino and sports betting apps | DMC
    · Clients: , (CASINO 용인 출장샵 CASINO 상주 출장마사지 AND SPORTSBOOK), CASINO GAMES & GAMES · 동두천 출장안마 · 공주 출장안마 Mobile: iPhone, iPad, Android, Tablet · FAQs: How 파주 출장안마 do I download the app on the App Store?

    ResponderExcluir
  6. Muito bom o texto. Gostaria de saber sobre " jamé" e "jamevu" termos franco-cametaenses

    ResponderExcluir
  7. Merecia um dicionário completo...rs

    ResponderExcluir